1. Prólogo
Numa
quieta manhã de quarta-feira pego-me ouvindo o cantor e compositor
americano James Taylor, expoente daquele soft rock 4-4-2 dos anos 70 que
as almas conservadoras e bundonas
não conseguem resistir. Em meio à fruição, sou pego de surpresa por este colete e este muquinho. Revisito sua discografia e eis que não há dúvidas: há algo na imagem do jovem James que intriga.
Aliança e cigarro: uma só mão, dois mundos. |
2. Introdução
Ele
era amigo dos Beatles, gravou
pela Apple, participou de festivais que promoviam a paz, era cabeludo,
tocava violão. Era um jovem como muitos naquele florescente final dos
60. Mas um olhar mais atento percebe que a duplicidade na imagem de
James se impõe: o algo-hippie garotão
ostenta bigode e camisas ordinárias. O petiz de espírito livre dividia
espaço com o pai gente boa de senso de humor duvidoso. Ambos no mesmo
corpo franzino, por baixo dos longos cabelos cujas entradas não
escondiam o que estava por vir. Sem mais, vamos às capas.
3. As capas de James
1968: a cafonice é a transgressão ou onde esta falhou? A folha seca na coxa de James simboliza uma crítica à cannabis sativa ou a "queima" da mesma?
1970: o flerte com a sobriedade.
1971: o bigode engrossou, a entrada avançou, o suspensório lipanjuniorizou. E agora, James?
1972:
sinais de distúrbio anti-social, laços estreitos com a natureza e o
abraço ambíguo no tradicional e exótico. Calças de veludo destacam-se.
1973:
aos 25 anos James já tem pouco de jovem a não ser as longas madeixas. O
sweater de tricô inaugura o vestuário conservador autêntico,
não-irônico.
1975:
esta merece especial atenção. Os cabelos já estão curtos, o bigode retorna
imponente, a coluna se curva e uma adorável papete adorna os pés de
James. Os trajes brancos e dedo amigavelmente em riste com o mar ao
fundo seria uma pajelança com requintes de Amado e Caymmi ou apenas um
método avançado de galhofa balzaquiana?
1976: capa e contracapa não deixam dúvidas. O tio zé graça chegou, faz
piadas auto-referentes e usa sandálias com meias. As ondas emitidas são
tão fortes que refletem aqui nos trópicos no mesmo '76.
1977: o álbum anti-punk. James se apresenta pelas suas iniciais (JT, jay tee), penteia o cabelo para o lado e usa uma camisa discreta; tudo como um bom vizinho americano.
1979: você logo vai entender. Essa capa deveria esconder
1981: isto, mas pretendia - em vão - esconder
1985:
isto, o processo que aqui se finaliza. "That's
why I'm here", ou seja, está aqui para dizer "estou careca, enrugado e
esquálido, mas em paz". Às discretas facetas ripongas, adeus. Ele cantará suas músicas, mas o fará como um pai de família.
4. Apêndice: o viés conjugal
Três fotos do
casal James Taylor & Carly Simon mostram de maneira bastante didática o percurso que se dá entre o pouco convincente cool ao confortavelmente brega:
5. Considerações finais
Chegamos ao fim dessa pequena viagem à obra, mente e figurino daquele que é um dos baluartes do ser tiozão com coração.
Um dos símbolos daqueles que se vestem como banqueiros e votam como
socialistas; falam como avôs e sonham como jovens; ostentam uma vasta
cabeleira e não abrem mão da camisa polo; tem no mesmo armário um All
Star e um chinelo Raider; comem em podrões e bebem água tônica; gostam
de The Clash e tem em Rod Stewart a representação do roqueiro inglês
ideal (e inclusive aceita, ouve e vangloria sua fase predador sexual);
bebem café religiosamente em dias úteis e fumam unzinho escondido dos
filhos aos domingos.
Enfim, aquele cuja moral não
permite despirocar,
mas não por isso se deixa levar pelo caminho tucano. James Taylor é
acima de tudo um indivíduo moderado que, mesmo quando arrisca, o faz
parcimoniosamente - à sua maneira e a seu tempo.